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Eat that doubt

Casal a dançar
Desenho de Fuinha


Ele, ao sol,

vermelho como um erro.

 

Eu a vê-lo;

a digladiar-me

com os sórdidos detalhes.

 

Nem a benevolência da luz

influía afinação na certeza.

 

Amor,

 

como a súbita chuva de verão, 

começa

prende-te a forma esquiva;

estaca em quieta complacência.

 

Dentro duma jarra

fica

 

como o cúmplice 

estoico

do segredo.

 

És a decisão

 

de quem segue

repetindo 

 

eat  that

                 doubt 

                  

ante a luz propícia,

contra a investida de uma condição.

 

 

Março, 2019

 

 

Nota: Eat that question é o título de uma música de Frank Zappa,

 que inspirou o título do texto.

 

Elsa 

Escrivaninha

Comentários

Anónimo disse…
Zappa inspira.
Excelente!
Anónimo disse…
A poeta finge a dor? É “cúmplice estóico” do que sente?
Bom, não sei. Talvez. Mas, possivelmente, não ignorará a experiência humana das emoções, dos sentimentos, dos pensamentos e dos seus estranhos enlaces.
Talvez finja, talvez esconjure. Mas utiliza efeitos de linguagem: “vermelho”, “antever-se”, “vê-lo”, “sórdidos detalhes dele”, “estaca em quieta...” como se a única certeza fosse a escolha afinada das palavras e das metáforas.
Estas divertem-na: “Vermelho como um erro”; “chuva súbita de verão”.
Estas salvam-na na decisão “de quem segue repetindo: “eat that doubt”
A poesia é tão difícil quanto iluminadora. Quem a lê só pode esperar uma viagem sem amortecedores.
Nem sei como tive o atrevimento de escrever esta invenção interpretativa!

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